Ser respeitado e ter os direitos garantidos traduzem a essência do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ celebrado anualmente em 28 de junho em todo o mundo.
Para além dessas questões, a data ganhou força ao longo dos tempos em virtude da conscientização que pretende estimular e ampliar sobre a importância – e urgência – da luta contra o preconceito. Um movimento em favor de uma sociedade mais igualitária e que trate igualmente as pessoas, independentemente da sua orientação sexual e identidade de gênero.
Essa real necessidade alavancada pelo movimento também se faz imprescindível nos ambientes corporativos, uma meta que se mostra desafiadora diante dos números.
De acordo com uma pesquisa de diversidade e inclusão realizada pela consultoria global Great Place to Work (GPTW), com mais de 14 mil pessoas, entre outubro de 2021 e junho de 2022, no geral apenas 10% dos funcionários das empresas avaliadas se autodeclaram pertencentes à comunidade LGBTQIA+.
Quando a análise parte para os funcionários em cargos de liderança, o percentual é de apenas 8%. E, no caso de cargos de presidência, o número é ainda menor: 6%.
Segundo a GPTW, a maioria das pessoas em cargos de chefia, direção e presidência são cis-heteronormativas e correspondem a 92%. Estamos falando daqueles que se identificam com o sexo atribuído a eles ao nascer e se atraem pelo gênero oposto.
Preconceito à flor da pele
Para Marcelo Rosa, coordenador de Inside Sales na multinacional francesa Edenred, os vieses inconscientes são os principais fatores para que as empresas não sejam ocupadas pela diversidade. “Quando fazemos um processo seletivo e colocamos critérios que excluem certos grupos de pessoas não estamos sendo diversos”, afirma o profissional cuja carreira retrata essa realidade.
O preconceito se fez presente logo na primeira empresa em que ele trabalhou. Além de não poder falar que era casado com um homem, vivenciou situações de preconceito velado e mesmo direto, por isso optou por sair de lá, mesmo com o crescimento profissional notório.
A nova oportunidade foi na Edenred, seu emprego atual e onde teve uma experiência diferente. Além do acolhimento, seu marido Jardel Lima, com quem é casado há 12 anos, já trabalhava na empresa, o que facilitou o processo.
Marcelo conta que mesmo assim, nem tudo correu como esperava e em determinado momento chegou a pedir demissão. Mas, para sua surpresa, recebeu uma ligação do CEO da empresa que, além de se desculpar, o convidou para impulsionar dentro da organização a questão da diversidade.
Era abril de 2021 quando aceitou o desafio de tornar real o debate interno sobre diversidade e começou a implantar de fato a diversidade na empresa. Desde 2022, é um dos líderes do GA LGBTQIAP+ e, atualmente, uma das lideranças que apoia todos os eixos de diversidade. “Não estamos 100%, temos várias lacunas e na alta liderança Brasil não temos pessoas LGBTIQIA+, mas temos um CEO comprometido que fala sobre diversidade e, principalmente, a empresa não aceita nenhum tipo de preconceito”, declara.
Inclusão participativa
Para chegar a esse patamar, ele explica que o projeto foi impulsionado pelas pessoas que trabalham lá, profissionais de todos os níveis hierárquicos que queriam fazer a diferença.
Como resultado dessa união, algumas conquistas merecem ser compartilhadas. Entre elas, a meta de destinar 50% das contratações no seu departamento para as pessoas dos grupos de diversidade e a formação de líderes para a diversidade.
Ele destaca também o apoio que a empresa dá para os profissionais LGBTQIA+ realizarem o processo de transição e a instalação de banheiros sem gênero em todos os escritórios do Brasil, em respeito às pessoas que não se sentiam bem ao usar os banheiros femininos ou masculinos.
“Tenho orgulho de onde chegamos, mas sei que temos muitas vitórias pela frente. Mas o que de fato me motiva no dia a dia é poder ser quem sou, sem ter que me esconder de ninguém”, conclui Marcelo.
Discriminação irrestrita
A discriminação experimentada por Marcelo Rosa também integra a rotina de trabalho dos profissionais LGBTQIA+ espalhados por empresas de todo o país.
Um estudo realizado pela consultoria Santo Caos, por exemplo, revelou que 65% dos profissionais LGBTQIA+ já sofreram discriminação no ambiente de trabalho e 28% já foram assediados. O índice de casos de discriminação é ainda maior quando analisadas apenas as pessoas trans e bissexuais: 86% e 72%, respectivamente.
A pesquisa foi realizada com 20 mil trabalhadores de todas as faixas etárias, de empresas do Brasil e de diferentes setores da economia, entre novembro de 2020 e abril de 2022.
Diante de estatísticas assim, Marcelo Rosa ainda joga luz a um aspecto relevante: a dificuldade enfrentada por esses profissionais para serem contratados. “Muitas vezes, temos de seguir por caminhos diferentes dos percorridos pelos heterossexuais e precisamos colocar à prova toda a capacidade para conseguir uma vaga”, explica.
Conquistas para todas as siglas
A boa notícia em meio a um contexto adverso, segundo o consultor, é que as oportunidades de mercado para as pessoas LGBTQIA+ estão aumentando, embora não sejam suficientes.
É preciso avançar muito e o papel das empresas é fundamental. “Precisamos preparar as organizações para receber, manter e desenvolver esses profissionais. Mais do que isto, elas precisam estar preparadas até mesmo para o desligamento. Não basta só ter vagas ou pessoas desses grupos”, afirma.
Outro aspecto essencial para ele diz respeito às oportunidades que as empresas devem dar para todas as siglas das comunidades. “Precisamos ter pessoas da letra T ocupando todos os níveis hierárquicos das empresas, precisamos ver as pessoas negras que pertencem à comunidade e que são inviabilizadas duas vezes, no mínimo”, avalia.
A referência a “todas as letras” significa mais oportunidades para aqueles que se identificam com a sigla LGBTQIA+, forma reduzida do termo completo LGBTQQICAPF2K+, que compreende Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis, Queer, Questionando, Intersexo, Curioso, Assexuais, Pan e Polissexuais, Aliados, Two-spirit e Kink. Ainda que não explícitos na sigla, também são considerados os Não-Binários e Drag Queens.
Diversidade na TKE
A TK Elevator dedica espaço e atenção à diversidade, por meio de um comitê criado para levar conhecimento e contribuir para o desenvolvimento das equipes, preparando as pessoas para a diversidade, equidade e inclusão.
“O Comitê convocou agentes que colaboram como participantes dos diferentes pilares com o objetivo de criar este espaço de segurança onde se possam abordar diversos temas, conseguindo assim conhecer-nos melhor, educar-nos entre todos e o mais importante conseguir uma zona onde o respeito abrace as diversidades de qualquer tipo. Dentro do pilar LGBTQIA+ temos a participação não só de colaboradores da comunidade, mas também de pessoas que lutam pelo respeito e a aceitação de seus integrantes. A cada encontro trazemos pontos e reflexões sobre o dia a dia, experiências ou situações que tenhamos enfrentado como membros da comunidade no horário de trabalho. Um debate importante, pois a empresa é nossa segunda casa e por isso cada colaborador precisa ter o seu espaço de respeito e aceitação”, afirma Christian Cornejo, Líder do Pilar LGBTQIA+ do Comitê de Diversidade, Equidade e Inclusão da TK Elevator.
Segundo Marcelo Rosa, as empresas que seguirem esse exemplo só terão a ganhar. Ele diz isso apoiado em vários estudos que correlacionam a diversidade com a lucratividade e o aumento de produtividade nas empresas.
Mas para ir em busca de um patamar assim, em que prevelecem, sobretudo, as boas relações, com espaços para todos, sem distinção, os debates são sempre necessários e uma poderosa porta de entrada em busca do ponto final para todos os tipos de preconceito.